06 março 2010

A CGTP-IN E O PROGRAMA DE ESTABILIDADE E CRESCIMENTO 2010-2013 (2)


Parte 2


Situação portuguesa: não comprometer o desenvolvimento do país

Uma política orçamental desadequada, assente na ideia de que a crise económica está ultrapassada, tende a prevalecer nas instituições europeias, o que pode ter consequências dramáticas criando condições para remergulhar algumas economias em profunda crise económica. Esse risco não pode ser minimizado na situação portuguesa.

Em Portugal a crise económica é muito complexa. Nela se cruzam factores de natureza muito diversa, externos e internos. Não se minimizam os efeitos da recessão internacional com uma forte quebra da procura dirigida aos nossos produtos que são agravados pela elevada exposição à economia espanhola, um país com uma crise mais profunda resultante do estoiro da bolha imobiliária.

Porém, a crise veio por a nu as fraquezas de uma economia que vinha a perder dinamismo e não conseguia aproximar-se da média comunitária. Este é um problema estrutural e pensar que se está assim devido à crise internacional é miopia. Podem-se multiplicar exemplos mas vale a pena reflectir sobre alguns aspectos: (i) o nosso crescimento tem tendência a estagnar e o nível de vida a distanciar-se dos países europeus; (ii) o elevado défice da balança comercial reflecte as dificuldades em aumentar exportações (que estão afuniladas em poucos países) e em substituir importações; (iii) a fraca capacidade de atracção de investimento directo estrangeiro (menos ainda no de qualidade) e a vulnerabilidade a deslocalizações – apostar em baixos custos da mão-de-obra não é pois saída; (iv) a séria incapacidade de captação de receitas públicas devido à extensão da economia clandestina e à “cultura” de fuga ao imposto (foge-se à obrigação de pagar, mas não de reclamar apoios do Estado).

A CGTP-IN não minimiza o problema do défice das contas públicas e o elevado endividamento. Mas não se devem confundir causas com efeitos e seria um erro voltar a uma lógica de endeusamento do défice público. O problema fundamental reside na estratégia de desenvolvimento do país.

- Deveremos fazer um debate sobre a necessidade e as formas de reindustrializar o país, já que estamos a pagar os custos de se ter pensado que o futuro estava só na economia de serviços;

- Precisamos de romper com a lógica de intervenção, de uma fracção significativa do sector privado, que vê o Estado apenas como o garante de formas de sacar dinheiro, ou de, designadamente a partir das parcerias público/privado, aceder a formas de capitalismo protegido.

- Temos uma necessidade imperiosa de moralização da governação, sem a qual é praticamente impossível sustentar compromissos sérios para fazer frente aos problemas;


Conciliar uma redução realista do défice com o desenvolvimento e o crescimento sustentável

A preocupação essencial deve ser a de não alienar o desenvolvimento, evitando cair constantemente na armadilha financeira. Nesta os países entram de novo em recessão, ou têm crescimentos muito baixos, e não conseguem reduzir os níveis de dívida, porque: o serviço da dívida (pagamento de juros) fica cada vez maior devido ao aumento das margens financeiras; a falta de crescimento torna mais difícil obter receitas fiscais; o valor da dívida real fica cada vez mais pesado. Se o país se desenvolver o peso da dívida cai porque este é medido em relação ao produto.

O país necessita que se impulsione fortemente a actividade económica e que a iniciativa privada (parte significativa dos empresários), que tanto propagandeia capacidades e virtudes, assuma as suas responsabilidades, deixando de situar no Estado toda a panóplia de mecanismos e medidas para resolver os problemas económicos. É claro que, o Estado precisa de apoiar a sustentação da actividade económica devido: (i) às consequências da recessão internacional sendo contraproducente a retirada apressada de apoios; (ii) às debilidades económicas, sendo necessário apostar numa economia baseada em produtos de alto valor acrescentado; (iii) à baixa qualificação do trabalho o que exige investimentos elevados na educação, formação e investigação científica. O Estado tem de responder a prioridades sociais em que se destacam a crise do desemprego, o que exige alargar as prestações de desemprego, e desenvolvimento de uma luta coerente contra a pobreza.

A redução dos salários reais, com o argumento de que a prioridade deve ser o emprego, não só não salva os empregos como deprime a procura interna. Portugal está hoje no grupo de países com maiores pressões deflacionistas, em conjunto com a Irlanda, o Japão e a Finlândia. Essas pressões serão agravadas se o desemprego e a moderação salarial se conjugarem na diminuição da procura interna. O salário não pode ser visto como um mero custo, ou como uma espécie de subsídio (sempre que possível a ser comparticipado pelo Estado): tem não só uma óbvia dimensão social, mas também, funções de dinamização da economia mais amplas e muito importantes.

Neste contexto, é preciso ter objectivos realistas de redução do défice e do endividamento, o que exige prazos alargados, ao contrário do que hoje as instituições europeias (Comissão, BCE, Conselho) pretendem impor. Só neste quadro poderá haver uma conciliação entre a sustentabilidade das finanças públicas, a recuperação económica e a resposta a prioridades sociais, nas quais se destacam os problemas relacionados com o desemprego, a pobreza e o envelhecimento.

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