06 março 2010

A CGTP-IN E O PROGRAMA DE ESTABILIDADE E CRESCIMENTO 2010-2013 (1)


A CGTP-IN e o programa de estabilidade e crescimento 2010-2013

Parte 1


Alarmismo sobre o Programa de estabilidade e de crescimento

O país tem vindo a ser submergido pela chuva e por uma onda de alarmismo sobre o Programa de Estabilidade e de Crescimento (2010-2013). Multiplicam-se artigos de opinião, entrevistas, documentos de reflexão: (i) apresentam-se cenários catastróficos da evolução das contas públicas; (ii) repete-se que vivemos acima dos nossos meios como se todos o fizessem; (iii) sugerem-se cortes de salários, de pensões, do 13º mês e avança-se estar em estudo a elevação da idade de reforma; (iv) afirma-se que o Programa tem de doer, mas não parece que se queira que doa a todos de igual maneira; (v) reitera-se que os impostos não podem subir como se já houvesse justiça fiscal e todos pagassem impostos.

Nesta multiplicação de receitas – feitas quase sempre na perspectiva de preparar a opinião pública para o aprofundamento de medidas anti-sociais – a crise propriamente económica, que tem conduzido à estagnação do nível de vida, parece ser coisa do passado. Como parecem ser de um passado já remoto declarações solenes de que tudo seria diferente depois da crise.

A CGTP-IN lembra que o agravamento das contas públicas, em Portugal como na generalidade das economias mundiais, resulta em grande parte de políticas de apoio ao sector financeiro, que se destinaram à sua protecção e tinham como objectivo revitalizar o papel de financiamento ao investimento. Constatamos que só em parte tais objectivos foram conseguidos, desde logo a salvaguarda das elevadas taxas de lucro do sector financeiro. Entretanto a parte de liquidez para o financiamento do investimento, a fazer quer pelas famílias, quer pelas empresas (no geral), não se concretiza.

Recessão e dívida pública na UE

A redução da dívida pública está hoje na ordem do dia num contexto em que diversos países apresentam elevados níveis de défice e de endividamento. É o caso da Grécia, que tem sido vítima de ataques especulativos dos mercados financeiros e de uma posição de apoio ambíguo de autoridades europeias cujo fim foi pressionar a adopção de medidas mais radicais. O que teve resultados: a Grécia, que tinha apresentado um plano de redução abrupto do défice público (de 12,7% em 2009 para 2,8% em 2012), foi coagida a apresentar um novo programa com maiores cortes na despesa e mais sacrifícios para os trabalhadores e pensionistas.

Esta diabolização da dívida pública esquece que os orçamentos públicos tiveram de socorrer um sistema financeiro à beira do colapso e que foi a crise económica daí resultante que provocou uma forte quebra das receitas fiscais e um agravamento da despesa com o desemprego.

Não foram retiradas as devidas consequências da pior crise das últimas décadas. A especulação retomou em força. Os bancos não estão hoje mais transparentes. Os paraísos fiscais não foram eliminados. Os mercados financeiros continuam a ser fonte de instabilidade. As empresas internacionais de notação financeira não só não pagaram pela sua responsabilidade na crise, como tornam agora reféns países vítimas de estratégias especulativas. A especulação retomou em força não só porque beneficia de taxas de juro do Banco Central Europeu (BCE) próximas do zero mas também porque as promessas de medidas de controlo dos mercados financeiros se não concretizaram.

Pretende-se, neste novo processo, submeter os pequenos países do Sul, como a Grécia, a condições draconianas, que penalizam severamente os mais vulneráveis, invocando argumentos que não foram usados quando se tratou de salvar o sector financeiro. Invoca-se o despesismo para justificar cortes salariais e cortes nas prestações sociais. Esquece-se que não foram estes países os responsáveis por um modelo de construção da moeda única desequilibrado ao não se prever instrumentos que permitam fazer face a crises desta natureza. Por isso, é preciso procurar soluções que impeçam que os Estados, em situação mais fragilizada, possam entrar em bancarrota e não sejam sujeitos à especulação desenfreada sobre as suas dívidas.

A situação que hoje se vive na UE contrasta vivamente com os compromissos dos Governos, em conjunto com as organizações sindicais e patronais, em procurarem saídas para a crise dando prioridade ao emprego, à protecção social e ao ambiente. E, no entanto, esses compromissos foram estabelecidos há menos de um ano, no âmbito da OIT e do Pacto Mundial para o Emprego. O G20 reunido em Pittsburgh comprometeu-se a colocar a qualidade dos empregos no coração da retoma. Dirigindo-se aos líderes do G20 Somavia, director geral da OIT, afirmou ser necessário “corrigir os desequilíbrios que contribuíram para a crise. Os salários atrasaram-se em relação à produtividade em muitos países contribuindo para os desequilíbrios entre consumo e poupança. Sobrevalorizou-se o económico, sobretudo o sector financeiro, em desfavor das dimensões sociais e ambientais da sustentabilidade”.

O caso revela uma lógica profundamente perversa. Os Estados são obrigados a financiar-se nos mercados privados para fazerem face às suas dívidas, com taxas de juro crescentes, enquanto as entidades financeiras que irão financiar os Estados são refinanciadas pelo BCE, a taxas de juro praticamente nulas.

A CGTP-IN considera, em relação ao Pacto de Estabilidade e Crescimento e sem prejuízo da posição critica que sobre ele tem, que a sua aplicação nos próximos anos deve ser flexibilizada tendo em conta a crise económica, a necessidade de não se pôr em causa o crescimento e de se priorizar a vertente social. A própria Estratégia Europa 2020, ontem divulgada, arrasta consequências orçamentais que têm de ser consideradas.


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