06 março 2010

A CGTP-IN E O PROGRAMA DE ESTABILIDADE E CRESCIMENTO 2010-2013 (3)


Parte 3



Reduzir o défice público cortando despesas desnecessárias…

A sustentabilidade das finanças públicas não deve comprometer o desenvolvimento. Mas exige também que as medidas de redução do défice compreendam não só o corte de despesas desnecessárias, a eliminação de desperdícios e a adequada utilização de recursos públicos e, ainda, o aumento das receitas do Estado, sendo imperativo a redução da economia clandestina, o combate à fraude e à evasão fiscal e contributiva e maior justiça fiscal.

Existe hoje uma forte pressão da direita e dos meios liberais no sentido de fazer recair todo o reforço do ajustamento na despesa, ao mesmo tempo que reclamam a redução de impostos e a baixa de contribuições sociais. Esta posição não atinge apenas os salários e esta ou aquela prestação social. O que está em causa é a protecção social e os serviços públicos essenciais e, de um modo mais geral, o modelo social.

Neste contexto valerá a pena recordar que o plano de estabilidade da Grécia, apresentado às autoridades europeias em Janeiro, prevê uma redução de 4 pontos percentuais do défice público em 2010, baseado quer na redução da despesa (2,1 pontos percentuais) quer no da receita (idem). Independentemente da apreciação da CGTP-IN a este plano, o qual originou já duas greves gerais, salientam-se, no lado das receitas, medidas como a reintrodução de um imposto sobre as grandes fortunas, a criação de uma taxa excepcional sobre os lucros e a eliminação de exonerações fiscais.

Não recusamos a consideração da vertente das despesas. Nem toda a despesa é virtuosa por ser pública. Há muitas que são desnecessárias e existe muito clientelismo, com desaproveitamento de quadros do Estado, que absorve recursos consideráveis. A despesa de funcionamento dos serviços poderá ser reduzida. Há também desperdício e falta de racionalidade na utilização de recursos públicos. A área da saúde demonstra-o: a promiscuidade entre o sector público e privado, a subutilização de equipamentos e o excessivo consumo de Meios Complementares de Diagnóstico e de Terapêutica têm pesadas consequências financeiras. Temos hoje uma necessidade mais premente de escrutínio da despesa pública.

Em relação aos grandes investimentos públicos, a CGTP-IN defende a reponderação de alguns dos seus aspectos, incluindo o prazo de realização, no contexto de um esforço de redução da dívida pública. A avaliação deve ser feita caso a caso porque há investimentos a fazer que envolvem elevados recursos e que são imperativos para que a protecção ambiental e, em geral, para o que se tem designado como a transição para economias de baixo carbono. Neste contexto é necessário, designadamente, que o investimento se desloque da infra-estrutura rodoviária para a ferroviária.

É imprescindível, restringir as parcerias público-privadas onde a despesa continua a aumentar (está previsto um aumento de 20% entre 2010 e 2013). Vem-se a assistir a uma perda de capacidade do Estado como produtor de bens e de serviços dentro da filosofia de que lhe basta regular. Esta desvitalidade conduz à perda de capacidade negocial do Estado face aos privados, já que não tendo alternativas, fica à sua mercê a quem garante, como a Sedes reconhece, “a rentabilidade comercial e financeira, numa espécie de capitalismo sem risco”, a que há que pôr termo.


… e aumentando as receitas do Estado

Para a CGTP-IN não se pode à partida considerar que a receita do Estado e a carga fiscal sejam tabus.

Primeiro, porque o agravamento do défice público se deve sobretudo a uma perda de receitas. A variação do défice do subsector Estado em 2009 é devida em 69% à redução da receita e em cerca de 31% ao aumento de despesa. Por sua vez, na segurança social as contribuições estagnaram (+0,3%) enquanto a despesa corrente subiu 11%.

Segundo, porque o nível da fraude e evasão fiscal e contributiva é muito elevado, como ilustra a cobrança fiscal de 2009. No ano passado, houve, para uma variação do produto de -2,6%, uma queda das receitas fiscais de 14% (19% no IVA) o que não é explicado só pela crise económica, ou, no caso do IVA, pela redução da taxa de imposto. E, entre 2005 e 2008, a dívida à segurança social aumentou 144%. Em termos gerais, podemos calcular a perda anual de receita em mais de 14 mil milhões de euros (preços de 2009), considerando um nível de economia clandestina de 25% e um peso de 35% das receitas fiscais no PIB.
Terceiro, porque é possível com as taxas em vigor obter uma maior receita fiscal, sendo para isso necessário atacar a fraude e a evasão e a multiplicidade de benefícios fiscais, o que explica a baixa taxa efectiva de imposto na banca. Este é um assunto recorrente, incluindo ao nível de grupos de trabalho que têm estudado a reforma fiscal (desde, por exemplo, o Relatório Silva Lopes), mas onde não há progressos.

Quarto, porque é possível e necessário obter uma maior justiça fiscal. Uma parte significativa da riqueza mobiliária continua escapar a qualquer fiscalidade significativa, quando se sabe que nas sociedades actuais a riqueza se tende a deslocar da componente imobiliária para a mobiliária. São necessárias evoluções na política fiscal, para realizar um triplo objectivo:

- Contribuir para a redução do défice das contas públicas, fazendo incidir os impostos sobre categorias que escapam à tributação, para grupos sociais mais favorecidos, incluindo a elevação do IRC para empresas com lucros mais elevados e a tributação reforçada dos lucros distribuídos;

- Obter uma maior justiça fiscal alargando a base do imposto e a progressividade;

- Responder a razões de natureza estrutural – envelhecimento da população, pobreza e transição para um economia de baixo carbono – no contexto da necessária e progressiva alteração da matriz de desenvolvimento.


Em síntese:

O Programa de Estabilidade e Crescimento 2010-2013 vai constituir um importante teste sobre a existência ou não de uma vontade política forte para romper com políticas que têm conduzido ao definhamento da estrutura produtiva do país; para conciliar medidas de saneamento financeiro com a necessidade de desenvolvimento do país; para efectuar uma repartição socialmente equilibrada de custos abrindo caminho a uma política de redução de desigualdades.

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